Procissões

Procissões, um elemento em todos os cerimoniais, devem ser encontrados, como é de se esperar, em quase todas as formas de culto religioso. Os exemplos de procissões com a Arca no Antigo Testamento (cf. especialmente 2 Samuel 6 e 1 Reis 8) e a triunfante entrada de Nosso Salvador em Jerusalém no Novo provavelmente não existiram sem influência dos rituais dos tempos antigos. Mesmo antes da era de Constantino, as procissões funerais dos cristãos parecem ter sido executadas com uma certa dose de solenidade, e o uso da palavra por Tertuliano (De Praescriptio, xliii) pode possivelmente fazer referência a alguma forma de progressão ou movimento dos fiéis em direção à igreja, que levou posteriormente à própria assembleia ou o serviço ser chamado de processio bem como synaxis e collecta (Probst, “Sakramentarien und Ord.”, 205). Por volta da época de S. Gregório Magno, e possivelmente antes, duas formas de procissão cumpriam grande parte no cerimonial papal. Uma era a procissão para a “Estação”, a outra a solene entrada do celebrante vindo do secretarium, ou sacristia, para o altar. Uma boa descrição da procissão estacional é dada no Ordo de St. Amand, n. 6 (Duchesne, “Christian Worship”, 474). O pontífice, o clero, e o povo reunido a igreja indicada, onde o clero era paramentado e o ofício começava. O povo pobre do hospital vinha primeiro com uma cruz de madeira pintada; as sete cruzes estacionárias, com três velas cada seguidas de um séquito, e então os bispos, padres, e subdiáconos; finalmente vinha o papa rodeado por seus diáconos, com duas cruzes carregas diante dele e a schola cantorum ou o coro o seguindo. À medida que a procissão se movia ao longo da igreja estacional onde a missa seria oferecida, o Kyrie Eleison e as litanias eram entoadas, de onde a própria procissão veio a comumente se chamar de litania. A entrada solene do celebrante enquanto ele procede da sacristia para o altar era evidentemente uma procissão em menor escala, mas ela também estava descrita minuciosamente no primeiro “Ordo”. O pontífice era novamente rodeado por seus diáconos e precedido por seus subdiáconos, um dos quais balançava um turíbulo, e uma característica conspícua era o grupo de sete acólitos carregando círios, o que nos faz pensar nas sete velas que agora são acendidas no altar nas missas solenes pontificais. Nesta procissão para o altar a antífona do introito era cantada. Em certas ocasiões especiais, notadamente no dia de São Marcos (25 de Abril), que coincidia com o antigo festival romano da Robigalia, e na Gália nos três Dias de Rogação antes da festa da Ascensão, elas era procissões de solenidade excepcional (ver Litania).

Embora agora não mais formalmente reconhecida como uma procissão nos livros litúrgicos, nós podemos dizer que a aspersão da congregação com água benta ao começo das missas paroquiais aos domingos preserva para nós a memória da procissão mais familiar da do início da Idade Média. O rito está prescrito nos Capitulares de Carlos Magno e de Luiz o Piedoso, bem como em outros documentos do século IX. Por exemplo, um Concílio em Nantes antes do ano 900 ordena que “todo domingo antes da missa, cada padre deve abençoar a água em um vaso que esteja limpo e seja adequado para tão grande mistério, para que o povo seja aspergido com ela quando entrar na igreja, e circunde ele o átrio [atrium] da dita igreja com as cruzes [processionais], aspergindo-as com a água benta, e rezar pelas almas dos que ali estiverem” (Mansi, “Concilia”, XVIII, 173). Nas cerimônias monásticas do mesmo período esta procissão da água benta às manhãs de domingo era normalmente descrita em muitos detalhes. Após a aspersão do altar-mor e dos outros altares da igreja pela ordem, o corpo completo dos monges, após eles próprios terem sido aspergidos, entram em procissão através do claustro, fazendo paradas ali, enquanto o celebrante, assistido por dois irmãos leigos abençoa as diferentes porções do monastério (see Martène, “De antiq. eccles. rit.”, IV, 46-9). Nos tempos atuais o Missal Romano, que é a autoridade litúrgica primária para esta “Bênção das pessoas com água benta a ser concedida aos domingos” (Benedictio populi cum aqua benedicta diebus dominicis impertienda), não fala nada sobre uma procissão, apesar de algum tipo de caminhada do celebrante e um assistente ao redor da igreja seja muito comum de ocorrer. A rubrica apenas indica que o padre tendo entoado a antífona “Asperges me” deve aspergir o altar, e em seguida a si próprio e seus assistentes. Após isto deve aspergir o clero e o povo, enquanto recita o Miserere com seus assistentes em voz baixa. As outras procissões ordinárias, em oposição às procissões extraordinárias, as quais o bispo pode ordenar ou permitir se as circunstâncias pedirem por tal forma de súplica pública, estão especificadas no Ritual Romano como sendo a Procissão das Velas na Purificação de Nossa Senhora (2 de Fevereiro), aquela das Palmas no Domingo de Ramos, as grandes litanias na festa de S. Marcos (25 de Abril), as procissões de Rogação nos três dias anteriores à Ascensão, e a procissão do Santíssimo Sacramento na festa de Corpus Christi. As prescrições a serem observadas em todas estas ocasiões estão devidamente especificadas no Ritual Romano. Para sua história etc., ver Candelária; Corpus Christi; Semana Santa; Litania, etc. Nós podemos também adicionar a estas procissões “ordinárias” o carregamento do Santíssimo Sacramento para o altar do repouso na Quinta-feira Santa e no seu retorno na Sexta-feira Santa, bem como a visita à fonte no Sábado Santo e a procissão que faz parte do rito da consagração dos santos óleos nas catedrais na Quinta-feira Santa. Esta última função é descrita plenamente no Pontifical Romano. Nos tempos antigos uma série de procissões era comumente realizada ao sacrário após as Vésperas a cada dia da semana da Páscoa (Morin in “Rev. benedict.”, VI, 150). Traços deste rito persistiram em muitas igrejas regionais até os séculos XVIII e XIX, mas não se encontra reconhecimento oficial deles nos livros de cerimônias romanos..

Sob o título de procissões “extraordinárias” o Missal Romano traz provisões para as seguintes emergências: uma procissão para pedir por chuva, outra para implorar por bom tempo, uma terceira para afastar tempestades, três outras atribuídas respectivamente para períodos de fome, praga e guerra, uma mais genérica para a ocasião de qualquer calamidade (pro quacunque tribulatione), uma forma bastante extensa (in which a number of the Jubilate and Laudate psalms are indicated for recitation) a título de ação de graças solene, e finalmente uma forma para a transladação de importantes relíquias (reliquiarum insignium). Na maioria destas procissões extraordinárias é direcionado que a Ladainha de Todos os Santos seja entoada como nas procissões de rogação, com uma súplica especial para a ocasião sendo geralmente acrescentada e repetida; por exemplo, na procissão para “clamar por chuva” a seguinte petição é inserida: “Ut congruentem pluviam fidelibus tuis concedere digneris. Te rogamus audi nos [Para que concedas chuva adequada aos teus fiéis, rogamos que nos ouça]”. Nos rituais medievais e processionais uma grande variedade de tais formas excepcionais pode ser encontrada, ligadas especialmente com súplicas pela produção da terra. Uma característica comum em muitas delas era fazer uma estação voltada para cada um dos quatro pontos cardeais e ler ao começo de cada uma um dos quatro Evangelhos com outras orações. A prática de carregar o Santíssimo Sacramento em tais ocasiões era frequentemente condenada nos sínodos medievais. Na Inglaterra a perambulação das paróquias nos “Gang days”, como eram chamados os dias de Rogação, perdurou até o século XVII. Aubrey, por exemplo, em uma nota marginal ao seu “Remaines”: “Nos Dias de Rogação os Evangelhos eram lidos nos campos de milho aqui na Inglaterra até o tempo das guerras civis” (Hazlitt, “Faiths and Folklore”, II, 478). O costume de fazer estas procissões era mantido aparentemente com uma visão de sua utilidade em imprimir na memória os limites da paróquia, e em alguns lugares os meninos eram açoitados nesses limites de modo a se lembrarem do local depois de crescidos. Nas liturgias grega e de outras igrejas orientais as duas procissões conhecidas como a grande e a pequena entradas formam uma característica muito majestosa do rito. Na “pequena entrada” o Livro dos Evangelhos é carregado por um diácono acompanhado pelos acólitos portando tochas e dois leques. A “grande entrada” ocorre quando os dons sagrados, i.e. o pão e o vinho, são solenemente levados ao altar enquanto o coro canta o famoso “hino querubínico”. Características similares parecem ter existido na antiga Liturgia Galicana; mesmo nas Missas Solenes Romanas nas quais arautos cantam os Evangelhos isto provavelmente é uma reminiscência de uma cerimônia mais imponente de tempos antigos.

Fontes

Martene, De antiquis ecclesiae ritibus (Venice, 1788), III, 177; IV, 45 sq., 280 sq.; CATALANI, Commentarius in Rituale Romanum (Rome, 1750); GRETSER, De processionibus in Opera omnia, V (Ratisbon, 1735), v; SANDERUS, Auctarium de ritu processionum (Ypres, 1640); EVEILLON, De processionibus ecclesiasticis (Paris, 1641); QUARTO, De processionibus ecclesiasticis (Naples, 1649); WORDSWORTH, Ceremonies and Processions of the Cathedral Church of Salisbury (Cambridge, 1901); Ceremonial of the Church (Philadelphia, 1894).